Por Rui Lamarques, Jornalista
Maputo (MOZTIMES) – Em muitos países, a assumpção de responsabilidade por falhas na gestão pública é vista como um acto de decência e respeito à função pública. Ministros, secretários de Estado e outros funcionários não hesitam em apresentar a sua demissão mesmo em situações onde a responsabilidade não recai directamente sobre eles. É o reconhecimento de que estar num cargo público implica uma responsabilidade moral perante a população e que, muitas vezes, a dignidade da instituição é mais importante do que a permanência no poder.
Uma visita ao Google mostra muitos exemplos: Em 2014, Coreia do Sul, após o naufrágio do ferry Sewol, que deixou mais de 300 mortos, grande parte deles estudantes, o então primeiro-ministro Chung Hong-won apresentou a sua demissão. Apesar de não estar directamente envolvido no incidente, ele reconheceu que o governo falhou na sua resposta e na prevenção de tragédias semelhantes.
No Japão, alguns anos antes, o ministro das Finanças, Shoichi Nakagawa, renunciou após parecer embriagado durante uma colectiva de imprensa no G7. Mesmo que o episódio não tenha causado danos directos à população, ele considerou que a sua conduta comprometeu a imagem do governo japonês. Só parecia estar embriagado como Muchanga naquele dia na STV.
Aqui no quintal também exemplos. Comecemos aqui ao lado, com a renúncia do Thabo Mbeki, incluindo 11 ministros, numa acção que visava manter a coerência e integridade do governo. Em São Tomé, por exemplo, o ministro das infraestruturas, Adelino Cardoso, demitiu-se do cargo na sequência de polémicas sobre a concessão de obras públicas. A sua saída foi relatada como um acto de responsabilidade perante as controvérsias.
Esses exemplos mostram que, em outros contextos, a renúncia é vista como uma demonstração de integridade, responsabilidade e respeito ao público.
Além disso, em situações de menor gravidade, países instituem gabinetes de crise para gerenciar problemas pontuais. Na França, após os atentados de 2015, um gabinete especial foi criado imediatamente para coordenar a resposta do governo, demonstrando prontidão e respeito às vítimas. No Reino Unido, após desastres naturais como enchentes, reuniões de emergência são convocadas para organizar a assistência.
Em ambos os casos, a ideia central é a mesma: evitar o agravamento da situação e oferecer respostas concretas à população.
E em Moçambique? Aqui, mesmo diante de tragédias evitáveis, corrupção generalizada ou a completa ineficiência de políticas públicas, não vemos renúncias. Pelo contrário, a regra parece ser a tentativa de se esquivar de qualquer responsabilidade. Enquanto em outros países ministros se demitem por muito pouco, em Moçambique, a incompetência é quase celebrada.
Tome-se como exemplo a recente crise de segurança e as fugas de prisioneiros na BO. Alguém assumiu a responsabilidade? Foi criado um gabinete de crise para gerir a situação? Nada. Se tivéssemos a mesma decência demonstrada por outros países, provavelmente hoje não haveria ninguém para demitir, pois todos os que ocupam cargos de relevância já teriam reconhecido seus fracassos e saído voluntariamente.
O que falta em Moçambique não é apenas eficiência ou competência, mas um senso básico de responsabilidade e ética pública. Enquanto continuarmos a aceitar que os que falham permaneçam no poder, continuaremos também a perpetuar um sistema que não serve ao povo. É hora de cobrarmos mais – e de aprendermos com os exemplos de fora, onde demitir-se não é um fracasso, mas um ato de coragem e respeito à função pública. (RL)