Por Noémia Mendes
Maputo (MOZTIMES) – O Governo pretende coordenar, a partir do nível central, as actividades das Organizações Não Governamentais (ONGs), através do Ministério da Planificação e Desenvolvimento (MPD). Ainda não está claro como essa coordenação será feita, mas a intenção está a gerar preocupação entre líderes da Sociedade Civil, que temem interferência governamental nas suas actividades.
O porta-voz do Governo e Ministro da Administração Estatal e Função Pública, Inocêncio Impissa, afirmou esta terça-feira, na cidade de Lichinga, que o Executivo quer ser incluído na gestão dos apoios recebidos pelas Organizações Não Governamentais e assegurar que os recursos cheguem efectivamente às comunidades.
“Parece haver alguma apetência de algumas organizações não-governamentais em escolher onde vão trabalhar e onde vão desenvolver as suas acções. Portanto, da nossa parte, não havia uma unidade que coordenasse a distribuição da acção dos parceiros das ONGs,” disse Impissa.
Ainda não há clareza sobre como o Governo pretende fazer essa coordenação e distribuição das acções das ONGs. Um diploma legal deverá estabelecer os termos. No entanto, Paula Monjane, Directora do Centro de Aprendizagem e Capacitação da Sociedade Civil (CESC), afirmou em entrevista ao MOZTIMES que tal coordenação não pode transformar-se num instrumento de controlo e restrição da autonomia das ONGs.
“O Governo tem o papel de coordenar actividades dentro do seu território, mas isso não pode significar interferência na autonomia das organizações da sociedade civil,” afirmou Monjane. “O Governo tenta silenciar as vozes críticas e controlar recursos, acreditando que as ONGs recebem fundos excessivos,” acrescentou.
A relação entre o Governo moçambicano e as ONGs, sobretudo aquelas que trabalham na monitoria da governação, tem sido marcada por desconfianças mútuas. O Executivo acusa algumas organizações de servirem interesses externos, utilizando tais alegações para justificar o aumento do controlo sobre as suas actividades.
Por sua vez, as ONGs têm denunciado práticas de corrupção e má gestão do bem público por parte do Governo, com exposição de irregularidades cometidas por governantes.
Augusta Atija, Delegada Provincial da Associação Moçambicana das Mulheres de Carreira Jurídica (AMMCJ) em Cabo Delgado, disse em entrevista ao MOZTIMES que o Governo não tem capacidade para gerir os apoios que as ONGs recebem.
“Há falhas na gestão de apoios humanitários por parte do Governo. Entre 2022 e 2023, registámos casos de desvio de ajuda destinada a famílias reassentadas devido ao terrorismo,” afirmou Atija.
O esforço do Governo para controlar as ONGs não é novo. Em Setembro de 2022, o Conselho de Ministros aprovou uma proposta de lei para regular a criação, estruturação e funcionamento das Organizações Sem Fins Lucrativos (OSFL), com o objectivo declarado de combater o branqueamento de capitais e o financiamento ao terrorismo.
A proposta gerou preocupações no seio das ONGs, que a interpretaram como uma tentativa de aumentar o controlo e silenciar vozes críticas.
O projecto de lei foi submetido à Assembleia da República e passou por um período de auscultação pública entre 6 e 16 de Fevereiro de 2023. Até ao momento, não há informações disponíveis que confirmem a sua aprovação ou rejeição definitiva pelo Parlamento.
No actual cenário político, onde a oposição enfrenta dificuldades para se consolidar, as ONGs, para além de prestarem ajuda ao desenvolvimento, desempenham um papel importante na defesa dos direitos humanos e na monitoria da governação. (NM)