Por Stélvio Martins
Maputo (MOZTIMES) – Moçambique enfrenta sérios riscos de ser visto como um refúgio para criminosos envolvidos em actos ilícitos na área financeira devido à falta de acções concretas para combater esse mal, segundo especialistas no assunto.
Por exemplo, a aplicação de crédito ilegal “Mz Cash”, operada pela Visioncred, Lda, desafia a supervisão do Banco de Moçambique (BM). Há preocupações de que essa plataforma, disponível na Play Store há mais de seis meses, esteja ligada à lavagem de dinheiro e ao financiamento do terrorismo. Isso ameaça perpectuar a inclusão de Moçambique na lista cinzenta do Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI).
A “Mz Cash” cobra taxas de juros exorbitantes. Colecta dados pessoais, como nomes, endereços e fotografias, e utiliza o banco móvel M-Pesa para conceder empréstimos. Além disso, emprega métodos coercitivos de cobrança de dívidas, incluindo visitas às residências dos clientes antes do vencimento do prazo de pagamento. Esta situação tem gerado denúncias online e deixa os usuários expostos a riscos de segurança.
A prática, segundo especialistas, evidencia a fragilidade do sistema de fiscalização financeira do país. O BM reconhece o problema e afirma, num documento em posse da nossa redação: “Há uma crescente proliferação de entidades não licenciadas que realizam actividades reservadas exclusivamente a instituições financeiras”.
Histórico de esquemas fraudulentos
A “Mz Cash” não é um caso isolado. Em 2022, a Vision Service, Soluções Financeiras +3000, uma empresa com práticas semelhantes, foi multada após um processo iniciado pelo BM. Apesar disso, a Visioncred, proprietária da “Mz Cash”, opera sem licença e fora do radar do órgão regulador.
Num e-mail enviado à nossa redação, o BM admite que “a VisionCred, assim como a aplicação Mz Cash, não estão licenciadas pelo Banco de Moçambique”. O banco afirma não ter conhecimento da existência dessas entidades.
A Visioncred, registrada no Boletim da República a 26 de janeiro de 2024 como uma empresa de consultoria financeira, contradiz a sua missão ao operar como uma entidade de crédito ilegal.
De acordo com o BM, apenas instituições licenciadas podem actuar nesse sector.
“A lei sujeita a concessão de crédito ao princípio da exclusividade, no qual somente instituições de crédito, sociedades financeiras, operadores de microcrédito e organizações de poupança e crédito podem exercer profissionalmente a actividade de concessão de crédito, independentemente do canal utilizado para isso”, afirma o comunicado do BM.
Desafios e impactos
O economista Egas Daniel alerta que as lacunas legais e tecnológicas no país permitem a proliferação de esquemas como este.
“O facto de Moçambique ainda estar na lista cinzenta do GAFI reflecte a fragilidade na implementação das leis e a incapacidade de rastrear fluxos ilícitos”, afirma o economista.
O Relatório de Avaliação Mútua de 2022 aponta os atrasos tecnológicos como um dos principais obstáculos. Ferramentas desactualizadas dificultam a identificação de crimes financeiros sofisticados e comprometem a transparência e o combate à lavagem de dinheiro.
Soluções urgentes
O Banco de Moçambique destaca a necessidade de colaboração entre instituições financeiras, órgãos de justiça e cidadãos para fortalecer a supervisão e promover a inclusão financeira. O economista Egas Daniel enfatiza que medidas de controlo rigorosas são essenciais para reverter essa tendência.
Sem acções concretas, Moçambique corre o risco de reforçar a sua reputação como um refúgio para actividades ilícitas, comprometendo, assim, a sua estabilidade financeira e a reputação internacional. (SM)