Por Rui Lamarques (ruilamarques@gmail.com)
Maputo (MOZTIMES) – O recente comunicado de imprensa emitido pelo Conselho de Estado após a sua VII reunião é, em muitos aspectos, revelador. Apesar da linguagem aparentemente ponderada, contém sinais claros de que o Estado moçambicano pode estar prestes a autorizar uma intervenção mais agressiva das Forças de Defesa e Segurança (FDS) para conter as manifestações no período pós-eleitoral.
A escolha de palavras como “envidar esforços” e a condenação veemente da “extrema violência” nos protestos podem parecer medidas justificáveis para proteger a ordem pública. No entanto, ao ler nas entrelinhas, torna-se evidente que esta é uma mensagem de alerta dirigida ao exterior, enquanto, internamente, as ordens provavelmente já foram dadas: reprimir com mais força e, se necessário, com mais violência.
É importante notar que, esta decisão não provém directamente do Presidente Filipe Nyusi, mas sim do Conselho de Estado. Isso não é casual. Ao envolver este órgão consultivo, Nyusi partilha a responsabilidade de uma eventual escalada repressiva, evitando ser visto como alguém que age unilateralmente. Essa estratégia também procura afastar qualquer suspeita de que ele poderia estar a utilizar a situação como pretexto para se perpetuar no poder, o que seria extremamente prejudicial para a sua imagem e para a estabilidade política do país.
Outro ponto que chama atenção é a tentativa de contrabalançar o tom duro com apelos ao diálogo e à revisão das leis eleitorais. Esses elementos soam mais como um esforço de relações públicas para apaziguar a sociedade civil e a comunidade internacional do que como um compromisso real com a mudança. Afinal, se o Estado estivesse genuinamente comprometido com a coesão social, como afirma, teria priorizado medidas inclusivas e transparentes desde o início, evitando o cenário de violência que vivemos agora.
Por detrás deste comunicado pode estar uma estratégia política mais ampla: usar a força para sufocar a contestação antes que ela ganhe proporções incontroláveis, enquanto mantém uma narrativa de compromisso com a paz e a legalidade. A presença de termos como “privilegiar o diálogo” e “recorrer à força somente em casos de extrema necessidade” parece mais uma tentativa de justificar qualquer acção violenta que venha a ser tomada, antecipando críticas e transferindo a culpa para os manifestantes.
Se a repressão de facto se intensificar, será um reflexo de um Estado que, em vez de enfrentar as suas próprias falhas estruturais — como a falta de transparência e a partidarização dos órgãos eleitorais —, escolhe o caminho mais curto e perigoso da força.
Eu quero muito estar errado. Quero acreditar que este comunicado representa um genuíno esforço para buscar consensos e evitar uma escalada de violência. Mas, infelizmente, a história recente ensina-nos que, em momentos como este, a repressão costuma prevalecer sobre o diálogo. Se isso acontecer, estaremos diante de mais uma oportunidade perdida de construir um futuro de verdadeira coesão e democracia para Moçambique. (RL)
PS: Texto escrito antes dos episódios de violência em Ressano Garcia.