- Empresa financiou forças militares que torturaram civis até à morte
- Em 2023 o consultor Jean-Christophe Rufin aconselhou a multinacional francesa a cortar relações com as Forças de Defesa e Segurança de Moçambique
Por MOZTIMES
Maputo (MOZTIMES) – A multinacional francesa TotalEnergies foi alvo, esta segunda-feira, de uma queixa criminal no Ministério Público francês, acusada de ter apoiado materialmente uma unidade militar moçambicana envolvida em tortura, detenções arbitrárias e desaparecimentos de civis na península de Afungi, distrito de Palma, entre Julho e Setembro de 2021.
Segundo um artigo publicado esta terça-feira pelo jornal francês LeMonde, a queixa foi apresentada pelo Centro Europeu pelos Direitos Constitucionais e Humanos (ECCHR), uma organização sediada em Berlim que trabalha em casos de violações de direitos humanos em zonas de conflito. Segundo o ECCHR, os soldados da Joint Task Force (JTF), destacados para proteger o projecto Mozambique LNG, terão detido dezenas de civis em contentores metálicos, onde foram mantidos famintos, espancados e torturados. Pelo menos cinco pessoas terão sido mortas e várias permanecem desaparecidas.
O caso ficou conhecido como o “massacre dos contentores” e foi revelado inicialmente por investigações jornalísticas do Politico, LeMonde e do colectivo SourceMaterial, apoiadas por imagens de satélite e vídeos recolhidos em 2021.
A denúncia sustenta que a TotalEnergies financiou directamente a JTF, fornecendo alojamento, alimentação, equipamento e pagamentos adicionais aos soldados, apesar de já existir informação interna alertando para abusos cometidos pelas forças de segurança moçambicanas contra civis.
Documentos internos da empresa, citados na queixa, mostram que, desde 2020, consultores e equipas no terreno alertavam para riscos elevados de violência contra comunidades locais, incluindo agressões físicas, extorsões e desaparecimentos. Mesmo assim, a cooperação com a JTF continuou até Outubro de 2023.
Em 2023, um relatório do consultor Jean-Christophe Rufin recomendou a empresa a cortar o financiamento directo às Forças de Defesa e Segurança de Moçambique precisamente para evitar associação com eventuais atrocidades cometidas pelas tropas moçambicanas.
Para o ECCHR, isto demonstra que a TotalEnergies sabia dos riscos de violação de direitos humanos associados à força que decidiu apoiar. A organização argumenta que a empresa pode ser responsabilizada penalmente por facilitar ou permitir crimes cometidos num contexto de conflito armado.
Segundo o artigo do LeMonde, a TotalEnergies nega ter tido conhecimento dos acontecimentos na altura e afirma ter pedido, em Novembro de 2024, uma investigação ao Procurador-Geral de Moçambique. O inquérito foi aberto em Março de 2025.
O projecto Mozambique LNG, avaliado em 20 mil milhões de dólares, é um dos maiores investimentos privados em África. A empresa francesa anunciou recentemente o levantamento da força maior e prepara a retoma das actividades, quatro anos depois da suspensão provocada pelo ataque terrorista de Março de 2021.
Organizações ambientais e de direitos humanos afirmam que o caso reforça as críticas de que o projecto beneficia interesses corporativos e militares, enquanto as comunidades locais continuam desprotegidas perante abusos tanto de insurgentes como de forças governamentais. (MT)
















