– Falta de recursos e barreiras socioculturais dificultam combate ao problema
Por Noémia Mendes
Maputo (MOZTIMES) – Entre 2019 e o primeiro semestre de 2023, Moçambique registou 3.371 casos de uniões prematuras, segundo dados do Ministério de Género, Criança e Acção Social (MGCAS). Destes, 883 chegaram aos Gabinetes de Atendimento à Família e Menores Vítimas de Violência. Além disso, 1.463 meninas foram reunificadas com as suas famílias, enquanto 1.025 foram reintegradas no sistema de ensino regular ou profissionalizante.
Apesar desses esforços, a implementação da Lei de Prevenção e Combate às Uniões Prematuras enfrenta desafios significativos, particularmente em áreas rurais onde barreiras socioculturais, como tabus e crenças tradicionais, continuam a perpetuar o problema.
“O casamento precoce ainda é visto como um benefício económico” disse Urcília Manhiça, gestora do projecto de prevenção de uniões prematuras da organização N’weti, aponta que práticas tradicionais e interesses económicos agravam a situação.
“Mesmo com investimentos feitos por diversas organizações, as famílias, muitas vezes, vêem o casamento precoce como uma forma de obter benefícios financeiros, o que perpetua o ciclo de violência e impede o progresso das políticas públicas”, disse Manhiça.
A gestora também destacou que a resistência cultural e interpretações equivocadas da legislação dificultam a erradicação do problema.
Desafios estruturais: falta de recursos e profissionais capacitados
Além das barreiras culturais, a escassez de recursos e a fragilidade das instituições têm comprometido os esforços de combate às uniões prematuras.
“As meninas vítimas de violência frequentemente não têm acesso a cuidados adequados ou a um sistema de justiça eficiente. Nalguns casos, há registos de menores sendo cadastradas como se tivessem 18 anos para facilitar a legalização dessas uniões”, explicou Manhiça.
A gestora também apontou que os tribunais raramente são accionados e, quando o são, enfrentam limitações em lidar com a complexidade dos casos, muitas vezes devido à falta de preparo técnico e recursos.
Redes comunitárias como alternativa
Apesar dos desafios, Manhiça reconhece o papel crescente das estratégias comunitárias na luta contra as uniões prematuras. Essas iniciativas envolvem líderes comunitários, homens e outros segmentos sociais para conscientizar sobre os direitos das meninas e combater a violência de género.
“A luta contra as uniões prematuras exige o comprometimento de todos, incluindo as autoridades, a sociedade civil e as comunidades. Precisamos fortalecer as redes de apoio para garantir que as meninas vivam livres de violência e tenham seus direitos respeitados”, concluiu.
Enquanto os números mais recentes mostram os esforços para lidar com a questão, é evidente que a erradicação das uniões prematuras em Moçambique dependerá de mudanças estruturais, culturais e políticas, além do fortalecimento das instituições e do engajamento da sociedade como um todo. (NM)