- Analistas preveem a continuidade de manifestações após a tomada de posse
- Contratação de especialistas em marketing é uma das principais estratégias para limpar a imagem
Por Ricardo Dias
Maputo (MOZTIMES) – Daniel Chapo toma posse esta quarta-feira como o 5º presidente de Moçambique. Entretanto, são levantados vários questionamentos, a nível nacional e internacional, sobre a regularidade e a transparência das eleições de 9 de Outubro, em que foi eleito presidente.
O primeiro trabalho de Chapo na Presidência da República será de ganhar a legitimidade, que não tem devido à fraude que marcou à sua eleição e à violência que se seguiu.
Recentemente, o parlamento português votou uma proposta de resolução recomendando o seu governo a não reconhecer os resultados das eleições moçambicanas. Embora a iniciativa seja de bancadas minoritárias, não teve a oposição das bancadas maioritárias, que optaram por se abster.
As figuras internacionais que poderão ou não estar presentes na cerimónia de tomada de posse de Daniel Chapo, serão um indicador da sua imagem junto da comunidade internacional. Muitos países certamente enviarão oficiais de escalão inferior para a cerimónia de tomada de posse de Daniel Chapo.
Chapo está ciente desta falta de legitimidade e por isso está a investir no marketing para criar uma imagem de um político honesto e tolerante, diferente do presidente cessante, Filipe Nyusi. A recente notícia de que Chapo contratou os serviços de um lobista norte-americano, Unik Ernest, para ajudar a melhorar e a legitimar a sua imagem a nível internacional faz parte desta estratégia.
Na equipa do próximo presidente moçambicano há também consultores nacionais e sul-africanos que estão a trabalhar para melhorar a sua imagem a nível interno.
Unik Ernest é um empresário americano de origem haitiana baseado em Manhatan que actua em várias áreas de negócios. Na sua conta no Linkedin apresenta-se como um arquitecto cultural que já participou na organização de eventos como o Super Bowl, campeonato mundial de futebol e campeonato das Nações Unidas. Também tem interesses na hotelaria e em clubes nocturnos. Diz já ter colaborado com celebridades como Joaquim Phoenix, Jamie Foxx, Rihanna, Spike Lee, entre outras. Também diz já ter trabalhado com diversas marcas como a Diesel, Nike, Valentino, entre outras. Na política americana é comum o recurso a lobistas. Contudo, o partido Frelimo costuma ser desconfiado em relação a actores externos que não sejam seus parceiros tradicionais. Esta opção de Daniel Chapo pode indiciar que tem uma estratégia pessoal de construir a sua imagem fora da Frelimo.
Em Moçambique, Chapo recorre a serviços de assessoria de imprensa de pessoas fora da Frelimo, mostrando esforço para construir a sua imagem própria. O recente encontro que Chapo teve com líderes da sociedade civil foi organizado a partir de fora da Frelimo.
Analistas entendem que Daniel Chapo, eleito nas eleições tidas como as mais fraudulentas de sempre e que levaram o país ao pior conflito pós-eleitoral, está à procura de legitimidade a nível nacional e internacional.
“Quando começaram as manifestações, a ministra dos Negócios Estrangeiros e Cooperação,Verónica Macamo, correu para reunir-se com os diplomatas estrangeiros antes de falar aos moçambicanos. Então, talvez a estratégia seja de encontrar algumas pessoas que ajudem nessa frente externa, enquanto, internamente, encontram-se outras forças que estavam fora do próprio sistema”, afirma Egídio Chaimite, em entrevista ao MOZTIMES.
Egídio Chaimite, professor de ciência política na Universidade Eduardo Mondlane e investigador em ciências sociais, entende que a contratação de actores externos deriva do facto de se perceber que há necessidade de mudanças.
“Eu penso que é uma constatação da necessidade de mudanças na forma de fazer as coisas e, por isso, está-se num bom caminho. Nesse sentido, é preciso mudar porque as coisas não estão bem, mesmo internamente. A forma como a coisa vem funcionando não é a ideal. É caduca. Talvez nessa perspectiva, estejam a olhar para a possibilidade de se trazer uma lufada de ar fresco. As figuras contratadas internamente são partes que eram bastante críticas ao sistema. Provavelmente, quer se encontrar um mecanismo para que possa captar melhor o que se vive na própria sociedade”, acrescentou Chaimite.
De acordo com o docente univesitário, os vários governos do partido Frelimo têm tido na sua equipa aduladores que lhes colocam nuvens sobre a realidade moçambicana e, por isso, “é altura de trazer novas formas de captar e agir sobre a realidade para dar respostas mais eficazes”, defendeu Egídio Chaimite.
“O problema é haver uma série de lambe-botas que colocam uma nuvem sobre a realidade”, disse o nosso interlocutor.
Embora Daniel Chapo tenha sido declarado como vencedor das eleições gerais, a sua legitimidade é questionada devido à popularidade sem precedentes do seu principal adversário, Venâncio Mondlane, que regressou ao país na semana passada e já convocou uma greve geral de 3 dias, que iniciou esta segunda-feira.
Chaimite entende que o país vai mergulhar em maior incerteza do que já está porque Venâncio Mondlane tem legitimidade. Prova isso nas ruas desde as eleições de 09 de Outubro. Para contornar a situação, Daniel Chapo não pode ignorar Venâncio Mondlane, o rosto da contestação que paralisou o país por mais de dois meses.
“Temos uma situação de bastante volatilidade. É preciso ter bolas baixas porque se todos puxarmos a corda ela arrebenta de todos os lados. E, por vezes, todos os lados caem numa cilada. A solução em todos os diferendos passa por um diálogo sincero que toque nas feridas sem armadilhas e sem jogos. Todos querem ganhar mas é preciso ser franco e honesto”, explicou Chaimite.
Por seu turno Sérgio Chichava, professor de Ciência Política também na Universidade Eduardo Mondlane, acredita que o facto de Daniel Chapo publicitar que esteve em encontros com diplomatas suíços e portugueses dias antes da tomada de posse, cimenta a ideia de que a União Europeia acredita que a FRELIMO é que está em melhores condições de governar o país.
Para o académico é expectável que Daniel Chapo irá usar isso como bandeira para dar a ideia de que tem legitimidade no exterior o que não significa que a tenha a nível interno.
“As pessoas sabem a quem escolheram e a quem querem. É uma grande tristeza do nosso país em que as pessoas são ditas que a única forma de chegar ao poder é através do voto e de um jogo democrático. Mas depois tudo é subvertido. Ganha quem controla as instituições e quem tem a capacidade de subverter as regras do jogo. É muito triste o que está a acontecer no nosso país”, disse o docente universitário.
Chichava não sabe se a equipa de consultores nacionais vai ajudar Chapo a governar melhor, mas entende que a limpeza de imagem se fará através de trabalho e não com publicidades nas redes sociais.
“A imagem se limpa com trabalho. As pessoas podem, com o andar do tempo, esquecer que ele não foi eleito. Que foi imposto, que é um presidente que está no poder de forma fraudulenta”, defendeu Chichava.
Aliás, Chichava recorda que Daniel Chapo não tem imagem beliscada, mas precisa de ser mais conhecido, ao contrário do partido que o suporta e governa o país desde a independência em 1975.
“Não sei se ele, em pouco tempo, vai conseguir resolver isso porque a situação é mesmo dramática. Se as pessoas votaram no outro candidato que não é o da FRELIMO é porque querem que os seus problemas e dificuldades sejam resolvidas”, disse Sérgio Chichava.
“As pessoas acreditam que o jogo democrático traz consigo a competição e isso poderia melhorar as condições de vida. Mas como não há jogo democrático tudo é imposto, como estamos a ver. Resvalamos em violência porque uns querem, a todo o custo, conservar o poder e para isso, como não têm legitimidade popular, a única legitimidade que lhes resta é a legitimidade das armas”, acrescentou Chichava.
Chichava acredita que as manifestações não irão cessar depois do dia 15 de Janeiro, data da tomada de posse de Daniel Chapo. Por isso fala da necessidade de diálogo sério, por forma a trazer um pouco de serenidade aos políticos, às pessoas que tomam decisões para que possam trabalhar mais ou menos tranquilamente.
“Mesmo se o Venâncio Mondlane subisse ao poder, em dois ou três anos depois, corria o risco de ficar impopular porque os problemas são imensos. As pessoas acreditam que com o Venâncio Mondlane no poder rapidamente terão esses problemas resolvidos o que é uma utopia porque o país tem dificuldades terríveis, colossais e estruturais que não se resolvem com uma varinha mágica”,
Chichava antevê que Daniel Chapo, que vai tomar posse esta quarta-feira, vá renovar o mandato dentro de cinco anos, independentemente do seu desempenho.
















